Meus caros irmãos,
Aproveito desta solene ocasião para desejar a cada um de vós uma abençoada santa Páscoa!
Como ouvimos no trecho do Evangelho de João (Cf. Jo 20,1-9), lido no dia da Páscoa, três amigos e seguidores de Jesus tiveram três experiências muito diferentes do evento do túmulo vazio: Maria Madalena, Pedro e o famoso “outro discípulo”, citado por João. No caso de Maria, vemos que ela chega ao túmulo ‘quando ainda é escuro’, um dos temas teológicos centrais, presentes no Evangelho de João: a luta entre a luz (Justiça) e as trevas (tudo o que não é de Deus). Ela é uma mulher sofredora por ter perdido seu Mestre e amigo. Provavelmente é esse o motivo de ela voltar ao túmulo, a fim de chorar a morte de Jesus e procurar respostas para perguntas que atormentam sua mente e seu coração. Contudo, o que vê provoca uma reação mais profunda, reação de medo, o medo de que malintencionados tenham roubado o corpo de Jesus. Talvez seja esse o motivo que a impele de voltar correndo à companhia dos discípulos e informar-lhes o que seus olhos viram.
O “outro discípulo”, “aquele que Jesus amava”, é a segunda pessoa a chegar ao túmulo antes de Pedro. Talvez porque ele era mais jovem, aguarda fora do túmulo, esperando respeitosamente a chegada do companheiro mais idoso. Somente após a chegada de Pedro e seu ingresso no túmulo, esse “outro discípulo” ousa entrar no espaço sagrado. Quando esse “outro discípulo” finalmente adentra o túmulo, algo acontece em sua vida. Acontece o reconhecimento de que Deus está fazendo algo grande em e através de Jesus – “viu e creu” – mas ainda não era claro o que significavam esses acontecimentos e que diferença teriam feito em sua vida.
Muitos estudiosos da Bíblia concordam em afirmar que esse “outro discípulo” é cada um de nós, seguidores do Senhor Jesus ressuscitado. Como esse discípulo”, talvez também nós nos encontramos em momentos diferentes de nossa vida, a correr em busca de respostas às perguntas da vida, que se tornaram ainda mais evidentes nestes tempos da pandemia Covid-19. Talvez nós, como o “outro discípulo”, chegamos a perceber no vazio, no medo e no isolamento provocados pela pandemia algo diferente em nossas vidas, em nosso mundo, algo que pede uma conversão mais profunda, uma verdade maior, uma justiça e uma paz mais profundas para poder verdadeiramente “ver e crer”. No que consiste esse “ver e crer”? Talvez seja a convicção de que Deus está aqui, que a esperança está próxima, que o amor de Deus em Jesus é um amor que se estende a todas as pessoas e a toda criatura, é mais forte do que a ameaça da pandemia, a ameaça da doença e da morte!
A terceira testemunha desses acontecimentos, Pedro, é aquele que negou conhecer Jesus, durante o processo, a condenação e a crucificação. Talvez seu silêncio seja resultado de seu sentimento de culpa, vergonha e total inconveniência. Muitas vezes, esses sentimentos provocam silêncio. Ele era somente um dos muitos discípulos e amigos que haviam abandonado Jesus, na hora mais obscura. Não há confissão de fé por parte de Pedro, como no caso do “outro discípulo”. Ou melhor, ele recolhe informações e, depois, retorna à “sala fechada com chave”, onde ele e outros discípulos e amigos de Jesus se haviam refugiado. É provável que, juntos, tenham discutido sobre o que haviam visto e percebido. Todavia, o vazio do túmulo e sua mensagem ainda não haviam penetrado nos grossos escudos protetores que Pedro, os discípulos e seguidores de Jesus, e que nós, muitas vezes, construímos para nos proteger daquilo que percebemos como perigo, ameaça, aquilo que nos provoca medo, confusão, raiva e até desprezo.
Meus caros irmãos, teria sido mais encorajador que eu falasse da segunda parte do capítulo 20 do Evangelho de João, que, segundo muitos estudiosos da Escritura, foi acrescentado num momento posterior como que para resgatar os impenetráveis eventos do sofrimento e da morte de Jesus, demonstrando aos discípulos a presença viva do corpo ressuscitado de Jesus. Contudo, creio que esse primeiro “encontro” com o túmulo vazio nos fornece importante instrumento para refletir sobre nossa experiência vivida com a pandemia Covid-19. Claramente, a escuridão cobriu a terra, exatamente como nos tempos primordiais, antes que Deus fizesse emergir a ordem do caos (Gn 1,2). Junto com toda a humanidade, temos vivido as ameaças do caos e do vazio provocado pela pandemia Covid-19. Estávamos isolados, privados de contatos físicos. Tivemos que nos revestir com “escudos” para proteger-nos do desconhecido, mas sempre presente, perigo, em tocaia num organismo invisível, capaz de nos causar grandes danos físicos, mentais, espirituais, sociais, econômicos e em todos os outros modos. Enquanto nos preparamos para sermos vacinados a fim de nos proteger, reconhecemos também que ainda há demasiadas coisas escondidas sobre o vírus para que possamos relaxar. A noite escura ainda não acabou.
A mensagem da Páscoa é mensagem que traz esperança e inspira coragem a todos os que professam a fé no amado Filho de Deus, Jesus. O túmulo vazio não nos dá respostas. Ou, ao contrário, cria um espaço no qual podemos colocar perguntas difíceis. Fornece lugar no qual podemos achar-nos face a face com tudo o que nos causa medo, tudo aquilo que nos empurra a escolher o isolar-nos de Deus, dos outros e por fim de nós mesmos, em vez de escolher a estrada em direção de uma autêntica fraternidade com Deus e com os outros. Enfim, a promessa da ressurreição dá-nos esperança. Todavia, essa esperança não é apenas o resultado de algo que vem de fora de nós, do crer no poder da graça e do amor de Deus. É, enfim, o resultado de uma decisão que tomamos do interior de nossas mentes e de nossos corações para acolher e abraçar Aquele que abraçou a morte a fim de poder conduzir todos nós rumo a uma experiência autêntica daquilo que significa estar vivos. A ressurreição de Jesus apresenta-nos uma escolha radical – viver diariamente na força do amor de Deus, que é mais forte do que os efeitos cruéis e escravizadores da injustiça, do racismo, do ódio, da violência e de uma terra espiritualmente desolada. O de viver na indiferença, no medo e na falta de esperança, oferecidas por tudo o que se opõe à justiça, à santidade, à bondade e à verdade.
Que o amor e a paz, que Jesus oferece a todos os que repõem Nele sua confiança, nos encha de alegria e nos reforce em nossa determinação de abraçar o caminho da cruz, o caminho do Evangelho, a abraçar também o túmulo vazio. Que, como Maria Madalena, “o outro discípulo” e Pedro, possamos experimentar o que significa verdadeiramente estar vivos em Cristo Jesus.
As Bênçãos da alegria pascal a vós, meus caros Irmãos, e também a vós, minhas caras Irmãs Clarissas e Concepcionistas de clausura. Também continuemos a rezar para que a graça amorosa de Deus se derrame sobre nosso Capítulo geral.
Votos de Boa e Santa Páscoa!
28 de março de 2021
Domingo dos Ramos
Frei Michael Anthony Perry, OFM
Ministro Geral e Servo
Fonte: Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil