A vida não é tirada, mas transformada

Imagens Ilustrativa (Fonte): CNBB Leste 2

Dom Jaime Vieira Rocha
Arcebispo de Natal (RN)

Aproxima-se o dia de Finados. Vamos celebrar a vida que brota da morte, fazendo memória dos nossos entes queridos. No dia 2 de novembro a Igreja nos exorta a que nunca esqueçamos que os que creem em Deus “a vida não é tirada, mas transformada”. Não se trata de uma outra vida, mas da nossa vida que, assumida por Deus, torna-se plena e glorificada.

Será um dia de oração pelos nossos mortos. Um dia de deixarmos a saudade falar mais alto. Não deve ser um dia de tristeza, embora a ausência dos que amamos nos faça sofrer. É um dia de esperança. De fato, em relação ao além devemos confessar nossa “docta ignorantia”, isto é, nada sabemos do mundo depois da morte. Com ela tem fim a história categorial de nosso conhecimento, das experiências sensíveis, da práxis que produz, das escolhas pautadas na liberdade, das decisões que se submetem às limitações do tempo e do espaço. A morte “é um evento que interessa todo o homem”. Ela é um acontecimento universal, natural e pessoal. Na experiência dos fiéis cristãos a morte pode ou deve ser vivida na contemplação do mistério pascal da morte e ressurreição de Jesus Cristo. Assim se expressa o Catecismo da Igreja Católica: “ela é o término da vida terrestre” (n. 1007), “é consequência do pecado” (n. 1008), ela “é transformada por Cristo” (n. 1009). Como homens e mulheres de fé cremos que “a morte é cume do processo em que se recebe e opera a salvação, se pensamos que a morte, enquanto ato do homem, é o evento que recolhe no único cumprimento o inteiro ato da vida, e se pensamos que na morte acontece ‘pragmaticamente’ o que misticamente já aconteceu nos pontos salientes sacramentais da existência cristã, no Batismo e na Eucaristia, o que é a assimilação à morte do Senhor”. Para a fé da Igreja “o que recebemos ‘sacramentalmente’, acontece ‘realmente’ na morte pessoal: a participação na morte do Senhor” (Karl Rahner. O sentido teológico da morte, p. 64-65).

Eis o que devemos ter sempre presente. Por meio da fé, por causa de nossa relação com Cristo, porque o Espírito de Deus habita em nós, o nosso olhar para o evento da morte é um olhar teológico, isto é, iluminado pela Revelação divina. Atentemos, portanto, ao sentido teológico da morte. Nunca nos deixemos levar por influencias macabras ou de terror no que diz respeito à morte. Nem pensemos em assombrações apavorantes. A morte não leva ninguém para um lugar em que a alma se torna disponível para trazer-nos experiencias de medo ou que nos faz presas fáceis de um sobrenaturalismo irracional.

Porque celebramos num dia, 2 de novembro, a memória dos “fiéis falecidos”, e o fazemos na Eucaristia, é a Liturgia da Igreja a trazer iluminação para o nosso entendimento correto sobre o significado da morte: “… por vossa sentença, retornamos à terra por causa do pecado. Mas, salvos pela morte de vosso Filho, ao vosso chamado despertaremos para a ressurreição” (MISSAL ROMANO. Prefácio dos fiéis defuntos IV); “E, desfeito o nosso corpo mortal, nos é dado, nos céus, um corpo imperecível” (MISSAL ROMANO. Prefácio dos fiéis defuntos I); “Um por todos, ele [Cristo Jesus] aceitou morrer na cruz para nos livrar a todos da morte” (MISSAL ROMANO. Prefácio dos fiéis defuntos II); “Por nossa culpa, somos condenados a morrer; mas, quando a morte nos atinge, vosso amor de Pai nos salva. Redimidos pela morte de vosso Filho, participamos de sua ressurreição” (MISSAL ROMANO. Prefácio dos fiéis defuntos V). E tudo isso, porque “Ele é a salvação do mundo. Ele é vida dos homens e das mulheres. Ele é a ressurreição dos mortos” (MISSAL ROMANO. Prefácio dos fiéis defuntos III).

Fonte: CNBB