Tocar as feridas de Cristo

Imagem Ilustrativa (Fonte): Catholic Pictures

Somos homens e mulheres que, no universo da fé, convivemos com o Ressuscitado. Essa certeza dá alento ao viver da Igreja e à nossa passagem por essa terra dos homens. Orações, devoções, ladainhas foram e são muitas vezes voltadas para as feridas de Jesus, mormente àquela de seu coração. Sempre se considerou que através da ferida do coração se revelava o mais íntimo de seu Mistério. Foram dolorosíssimas as feridas do corpo do Senhor!

Tentemos refletir sobre estas linhas de Tomás Halík: “De que consiste a dor verdadeira, o fardo e a escuridão da cruz? Não são as torturas físicas, nas quais o senso piedoso se deleitava tanto, não é nem mesmo a própria morte física. É algo diferente, mais profundo, algo que provoca terror ainda maior. Tocar as feridas de Cristo, não só as feridas de suas mãos e seus pés, que testificam o sofrimento físico, mas também a ferida do lado, que atingiu o coração, significa tocar a escuridão da qual testemunha o grito do homem completamente abandonado por Deus. A ferida até o coração é aquilo que se expressa na palavra de Jesus, aquela que um único evangelista teve a coragem de documentar: Meu Deus, por que me abandonaste?”. (Toque as feridas, Vozes, p.43).

Por vezes, costuma-se atenuar o peso dessas palavras dizendo que se trata de uma citação do salmo 21(22) que termina com uma nota de vitória, marcada por otimismo. Halík afirma que nesse grito vislumbramos a escuridão daquele momento a respeito do qual o credo apostólico afirma que ele desceu à mansão dos mortos. “Nesse momento sua fé foi crucificada e traspassada, sua unidade com o Pai; nesse momento “Deus morreu” para ele e nele. Jesus tomou sobre si não só a morte humana, mas também a morte de Deus” (op.cit, p. 44).

Reconciliador, Salvador, é aquele que veio unir o que estava separado pelo pecado. “Solidarização” com os pecadores, tendo em vista unir os que estavam separados. Já no seu batismo, Cristo havia se colocado na fileira dos pecadores que iam se dirigindo rumo ao Jordão. “Este é meu Filho Amado: escutai-o”. Através de gestos e palavras, Ele vai tentar colocar as bases de um mundo de harmonia entre nós, homens, e entre estes e o Pai. Ele se fez pecado para unir o que estava separado. Na cruz morre o Filho do Altíssimo e o pecado do homem.

Momento de escuridão para Jesus. Penso no condenado à morte, mal ou bem culpado, penso nas torturas infringidas a uma mãe quando um filho drogado quer saber onde está o anel de ouro, penso nessas crianças violentadas.

Meu Deus, porque me abandonaste?

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

Fonte: Província Franciscana da Imaculada Conceição do Brasil